O bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro, sempre foi palco de um desenvolvimento um tanto polêmico. Isso vem desde a época da Corte, que cedeu uma área extensa a um militar português e depois um bispo corrupto roubou suas terras. Com isso, a grande floresta deu início a fazendas de café no começo do século 19, passando a ser divididas, resultando em cortiços.
Segundo o escritor Antonio Augusto Brito:
“Com a abolição da escravidão, os investidores precisaram de novas formas de ganhar dinheiro; então, eles começaram a lotear essas fazendas em terrenos menores, construir ruas, o que atraiu a população.”
E ressalta ainda:
“O tipo de moradia tinha muitos problemas de saúde, devido às condições precárias de habitação e à quantidade massiva de moradores.”
Entre as décadas de 1940 e 1950, o bairro de Botafogo vivenciou outro momento similar com o surgimento das quitinetes em prédios enormes.
Botafogo nos tempos atuais
Hoje, Botafogo lida com a valorização do metro quadrado, e o bairro enfrenta outro impasse: o retorno dos miniapartamentos. Em 2019, com a aprovação de um novo Código de Obras na capital carioca, houve uma flexibilização dos projetos, o que inclui unidade a partir de 35 metros quadrados na zona sul da cidade.
Agora, de um lado estão as construtoras que miram os imóveis que atendem especialmente parte dos jovens e novas modelos de família. Estas configurações vem com serviços completos na área comum, como coworking e lavanderia, como afirma o sócio e CEO da Bait Incorporadora, Henrique Blecher:
“Botafogo se transformou numa alternativa superadequada para uma geração de pessoas que quer comprar o primeiro imóvel. Tem tudo ao redor, clube, restaurante, serviço, escola, hospital e mobilidade urbana, e é central.”
A empresa é uma das construtoras que lançará um novo empreendimento com unidades de dois e três quartos e também de quarto e sala no bairro.
Porém, por outro lado, tal sucesso do bairro e interesse das incorporadoras também gera motivo de preocupação para os residentes do local. Sobre isso, a presidente da Associação de Moradores e Amigos de Botafogo (Amab), Regina Chiaradia, explica que tais alterações só privilegiam empresários e podem prejudicar os atuais moradores:
“Para nós, é péssimo. É um código que vem atender ao mercado, e não à população. Em um bairro já saturado como o nosso, a infraestrutura não dá conta.”
metragem mais barata da zona sul
Para Brito, não se trata somente de uma gama de serviços e de opções de lazer que atraem novos moradores, mas também está ligado ao resultado de um preço por metragem mais barato, se comparado a outros bairros da zona sul.
“Botafogo tem uma característica urbana que é o limite de construção. A questão é que, assim como tem muito morador que reclama hoje do crescimento, há quem goste das mudanças.”
O escritor ressalta ainda que outro fator polêmico envolve as terras de Botafogo. É o caso do Mirante do Pasmado, que nos anos de chumbo da ditadura, causou um “processo de higienização”. Sendo assim, governantes da época removeram à força os moradores da favela urbanizada que tinha no local. Este foi o primeiro incêndio programado em uma comunidade de que se tem notícia, ele revela. E como consequência foi aberto um espaço para a especulação imobiliária do bairro:
“A discussão do momento é o projeto de construção de um memorial em homenagem às vítimas do Holocausto, em forma de um monólito de 20 metros de altura. A homenagem é ótima, mas não ali, que é um local de preservação ambiental.”
Fonte: O Globo
*Foto: Divulgação / Ana Branco / Agência O Globo