Prédio Wilton Paes de Almeida, que pegou fogo em 1º de maio de 2018, no centro de São Paulo, agora vai se tornar tema do documentário “Pele de Vidro” pelos olhos da filha do arquiteto que projetou o empreendimento, em 1961
O incêndio que levou o edifício Wilton Paes de Almeida abaixo e culminou em algumas mortes de pessoas que fizeram do prédio seu lar, com ele também foi enterrado o projeto arquitetônico do local, construído em 1961.
Agora, o edifício será tema do documentário “Pele de Vidro”, da diretora Denise Zmekhol, filha do arquiteto Roger Zmekhol, que foi responsável por desenhar o primeiro edifício em altura da América Latina, que possuía uma fachada de vídeo independente da estrutura.
Edifício Wilton Paes de Almeida
Em virtude do estrondo da explosão, os vidros se partiram e com isso não sobrou absolutamente nada da arquitetura original do edifício Wilton Paes de Almeida. A documentarista Denise agora contará a história do prédio de outro ponto de vista, que faz reverência a seu pai.
No documentário “Pele de Vidro”, será abordado também o desfecho trágico das 300 famílias que tornaram o prédio na região central de São Paulo, seus lares. A narrativa é uma espécie de carta ao pai de Denise, que faleceu quando ela tinha apenas 14 anos, em 1976.
Arquitetura do prédio Wilton Paes de Almeida
Zmekhol desenhou a planta do prédio Wilton Paes de Almeida em uma época que a arquitetura moderna brasileira estava em seu auge. E projetar um edifício para os escritórios de uma empresa de vidros entrou para a história dos prédios dos anos 1960.
No entanto, o empreendimento adquiriu dívidas com o passar dos anos que resultou na perda para o governo. Em seguida, ainda no período da ditadura militar, o local se tornou sede da Polícia Federal.
Já nos anos 2000, o prédio ficou em estado de abandono pelo INSS, que seu último ocupante. Com isso, o edifício Wilton Paes de Almeida acabou se tornando moradia para famílias de migrantes e imigrantes, como um dia já foi o arquiteto Roger Zmekhol.
História da família Zmekhol
O arquiteto Roger Zmekhol apesar de ter nascido em Paris, em 1928, ele descende de uma família síria cristã que viveu exilada na capital francesa por motivação de perseguição religiosa, no início do século 20. Em seguida, Roger e seus familiares se transferiram para São Paulo.
Em 2015, a diretora de “Pele de Vidro” viu pela primeira vez a obra-prima de seu pai ter se tornado uma favela vertical, por meio de imagens pesquisadas na internet.
Denise vive radicada nos Estados Unidos há 21 anos. E o que tinha de memória do projeto arquitetônico de seu pai era um tour feito com um amigo também arquiteto. Em declaração à Folha de S. Paulo, ela disse:
“Era um prédio tombado, importante para a história da cidade, um prédio que meu pai fez”.
Todavia, ela resolveu inserir em seu filme a história daquelas famílias que viveram seus últimos dias dentro do edifício Wilton Paes de Almeida. Essa decisão veio antes mesmo da tragédia de maio do ano passado, em decorrência dela entender o contexto de realidade em que aquelas pessoas tinham que aguentar no dia a dia.
Filmagens no prédio Wilton Paes de Almeida
A documentarista veio pela primeira vez filmar em São Paulo o “Pele de Vidro”, em outubro de 2017. Foi quando ela tentou conhecer os moradores da ocupação. No entanto, ela só conseguiu ter acesso ao lobby do edifício.
Ela ainda ressaltou durante a entrevista à Folha:
“Se não iam me deixar contar a história de dentro para fora, contaria de fora para dentro”.
Dessa primeira aparição no prédio de seu pai, surgiu também algumas das últimas imagens da estrutura do empreendimento de pé. As cenas foram captadas por meio de edificações ao redor e do auxílio de um drone. Nesta época, chovia muito na capital paulista e a equipe de filmagem teve que aguardar as chuvas de verão cessarem, em fevereiro de 2018.
Pós-incêndio
Um mês após o incêndio que culminou em mortes e na destruição do prédio Wilton Paes de Almeida, as filmagens se concentraram nos desabrigados que ficaram acampados no Largo do Paiçandu, em frente ao local da tragédia.
O documentário “Pele de Vidro” enfrenta agora a falta de recursos para ser finalizado. Os responsáveis têm viajado para apresentar o plano de negócios da produção para captar o dinheiro que falta. A intenção era lançar o filme juntamente com o livro que relata vida e obra do arquiteto Roger Zmekhol, organizado pela filha e pelo arquiteto Perrota-Bosch, que sairá em 2020 pela edições Sesc.
O propósito do documentário não é apenas contar a história do projetor do edifício Wilton Paes de Almeida, e sim também chamar a atenção das pessoas para a questão dos sem-teto.
Denise conclui:
“Tem um grande desafio de a gente comunicar com essa outra metade da população, no Brasil, nos Estados Unidos, onde a gente está vivendo essa polarização. Espero que essa história pessoal seja vista por outras pessoas, não só as de esquerda”.
Fonte: Folha de S. Paulo
*Foto: Reprodução/Raul Juste Lores/Veja SP